segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Emissora de Televisão Condenada por Abuso do Direito de Informar


A 10ª Câmara Cível do TJRS condenou o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT) ao pagamento de indenização, por danos morais, no valor de R$ 15 mil. O autor da ação teve seu nome e imagem associados ao roubo de carros em uma matéria veiculada no programa SBT Rio Grande.
O Juízo do 1º Grau condenou a empresa ao pagamento de indenização pelos danos morais no valor de R$ 30 mil. No TJRS, os Desembargadores mantiveram a condenação, diminuindo o valor para R$ 15 mil.
Caso
O autor da ação narrou que houve exposição de sua imagem em cobertura de televisão, bem como manutenção nos arquivos da Internet, quando foi preso pela autoridade policial na companhia de outro, por supostamente estar envolvido em roubo e receptação de veículos.
No entanto, o autor explicou que estava no local de modo eventual, sequer tendo sido autuado em flagrante pela autoridade policial, sendo ouvido como testemunha. Segundo o advogado do autor, o SBT fez a cobertura televisiva tratando seu cliente como se fosse um marginal, mostrando sua imagem algemado e jogado no chão como um animal, insinuando tratar-se de ladrão e assaltante, participante de quadrilha.
Após a divulgação da reportagem, o autor perdeu o emprego e virou motivo de piadas. Mesmo após a conclusão do auto de prisão em flagrante, onde foi constatado que o autor não era autor de nenhum crime, a matéria continuava a ser exibida na internet.
O autor requereu o pagamento de indenização por danos morais.
Sentença
O processo foi julgado na 7ª Vara Cível da Comarca de Porto Alegre. O Juiz de Direito Heráclito José de Oliveira Brito julgou procedente o pedido.
O magistrado apontou a imprudência ao informar já na chamada da notícia: E quantas vezes você já foi assaltado? Tomara que nenhuma, mas tem gente que realmente é premiado pelo azar. A reportagem do SBT Rio Grande acompanhou o momento da prisão em flagrante de uma dupla de ladrões de carros. E a surpresa: com eles estava um carro que foi roubado duas vezes seguidas.
Analisou o Juiz que, tivesse a matéria jornalística se limitado a reportar que dois homens tinham sido presos como suspeitos da prática de determinado crime, então o papel da imprensa estaria isento de responsabilidade. Entretanto, ao atribuir ao autor a condição de LADRÃO DE CARROS, condiciona o espectador ao juízo de valor depreciativo, induzindo em erro quem ouve ou escuta.
Segundo o magistrado, a equipe de reportagem do SBT não se preocupou em acompanhar o caso até o final. Deixando a meio-termo a informação, desapegou-se a empresa ré de seu papel de informação da verdade, preferindo condenar desde logo o autor, devendo então arcar com as consequências de sua precipitação, afirmou o juiz.
A empresa foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30 mil. Houve recurso da decisão.
Recurso
No Tribunal de Justiça, o caso foi julgado pela 10ª Câmara Cível do TJRS. O Desembargador relator Paulo Roberto Lessa Franz manteve a condenação pelos danos morais, mas diminuiu o valor da indenização para R$ 15 mil.
Em sua decisão, o magistrado ressaltou que, segundo a delegada que acompanhou o caso, o autor da ação constou apenas como testemunha do flagrante realizado pela polícia. Ficou amplamente demonstrado que extrapolaram, e muito, através da matéria veiculada, sua liberdade de expressão e informação, que não são absolutos, afirmou o Desembargador.
O valor da indenização foi diminuído, pois a reparação do dano não pode servir de causa de enriquecimento injustificado. Ficou determinada o valor de R$ 15 mil na indenização por danos morais.
Apelação nº 70044520542

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Crime ao Vivo - Reportagem de Cecília Olliveira

Aumento da sensação de medo e da insegurança social e “ondas de criminalidade”. É o que revela a pesquisa “Crime ao vivo: As representações sobre crimes e criminosos na imprensa gaúcha”, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa em Ciências Criminais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. [disponível em http://prvl.org.br/noticias/crime-ao-vivo/] 

Com o objetivo de indicar representações e realizar o mapeamento do conteúdo e forma como as notícias sobre o crime, a criminalidade e a resposta punitiva são veiculadas nos três jornais de maior circulação no Estado, o coordenador do Departamento de Ciências Penais da Faculdade de Direito, Salo de Carvalho desenvolve a pesquisa desde meados de abril de 2011.

Desde então, foram acompanhadas diariamente a cobertura do crime e da criminalidade nos principais veículos da imprensa escrita gaúcha – Jornal Diário Gaúcho, Jornal Correio do Povo e Jornal Zero Hora. Dividida em dois eixos – matérias criminais (relativas à cobertura específica de fatos delitivos) e matérias penais (relativas à cobertura de questões político-criminais como, p.ex., reformas legislativas, questão carcerária etc.) – a pesquisa analisou um total de 169 matérias penais e 740 matérias criminais.

"De forma preliminar algumas questões chamam atenção. Em relação à forma de abordagem da criminalidade, ficou evidenciada a distinção no tratamento entre os crimes comuns e os crimes político-econômicos. Outra questão igualmente interessante, em relação às matérias político-criminais, é a falta de qualidade técnica de certas reportagens, fato que acaba produzindo informações equivocadas aos leitores”, diz Salo, que explica ainda que a linguagem tende a ser mais técnica e imparcial – inclusive com determinados cuidados relativos ao sigilo de informações que não ocorre na cobertura da criminalidade comum. “O maior exemplo foi a cobertura sobre a alteração da legislação que trata das prisões cautelares que, em grande parte da imprensa, foi tratada como uma questão de execução penal, ou seja, relativa à penas definitivas. O tema foi bastante negligenciado e o resultado foi a comunicação de que havia sido aprovada uma lei que geraria impunidade, o que de fato não corresponde com a realidade”.

Segundo as análises da ANDI, os conteúdos sobre violência são os que apresentam os índices mais baixos de contextualização e de debate sobre políticas públicas. “Em geral as notícias estão enquadradas por um viés individual, o que contribui pouco para a busca por soluções para o problema”, ressalta o gerente de qualificação e monitoramento de mídia da ANDI – Comunicação e Direitos, Fábio Senne.

Papel da Imprensa
Acreditamos que a imprensa é um ator central para agendar o que deve ser prioridade dos decisores e formuladores de políticas públicas. Quando o noticiário que descreve uma “onda de criminalidade” certamente tem o poder de chamar a atenção da sociedade e das autoridades, mas precisa estar pautado por estatísticas e dados técnicos, sob o risco de se tornar uma construção meramente midiática. Não correríamos esse risco se a imprensa promovesse um debate mais intenso sobre as políticas de segurança pública de forma ampla”, diz Senne.
Um marco regulatório para imprensa resolveria tais questões? Para Salo de Carvalho, a discussão é importante, mas antes disso deve-se discutir a ética. “Antes de qualquer normatização é necessário que a classe perceba isto como problema. Do contrário, a tendência é uma reação contrária a qualquer forma de controle, mesmo os controles democráticos que servem para qualificar o jornalismo”.
A pesquisa constatou falta de preparo técnico dos jornalistas para compreender o tema e transmitir a informação. Para o pesquisador, a forma narrativa utilizada pela imprensa reflete a forma que nos reportamos cotidianamente, já que as pessoas costumam ser sensacionalistas no seu dia-a-dia quando transmitem informações, amplificando problemas e estereotipando pessoas e situações. “Em temas complexos como crime e criminalidade, em que há certo fascínio pelo sensacionalismo, isso acaba sendo convertido na criação de pânicos morais (amplificação de casos, criação de estereótipos, moralização e simplificação das formas de interpretação dos problemas sociais). Devemos pensar seriamente sobre ética e responsabilidade na forma de noticiar os fatos”.