We are sorry
Vilson Antonio Romero, jornalista e diretor de Direitos Sociais e Imprensa Livre da Associação Riograndense de Imprensa [Fonte Espaço Vital, 28/07/11]
A imprensa mundial acompanha, um tanto quanto perplexa, os diversos capítulos do escândalo que afeta a gigante de mídia News Corporation, do magnata australiano Rupert Murdoch.
A denúncia de supostos grampos telefônicos do tablóide britânico News of the World se avolumou ao atingir a polícia local e respingar no governo, além de render centenas de ações judiciais de cidadãos comuns e personalidades.
Já repercute inclusive no braço norte-americano da rede onde estão potências da mídia como The Wall Street Journal e The Times, a rede de TV Fox e o estúdio de cinema 20th Century Fox. Além do fechamento do News, do “sentimos muito” (“we are sorry”) publicado com letras garrafais por Murdoch nos principais jornais da Grã-Bretanha e afora todas as intercorrências jurídicas, policiais e comerciais, o que deve servir de reflexão é o efetivo papel da chamada “penny press” ou da “yellow press”.
A expressão americana “yellow press” ("jornalismo amarelo") surgiu no final do século XIX num episódio da concorrência entre os jornais New York World e The New York Journal. Eles se digladiavam para ter em suas páginas as aventuras de Yellow Kid, a primeira tira em quadrinhos da história. A disputa nos bastidores foi tão pesada que o amarelo do cobiçado personagem acabou virando sinônimo de publicações sem escrúpulos.
Em terras tupiniquins, a “yellow press” virou “imprensa marrom” em 1959, quando a redação do jornal carioca Diário da Noite recebeu a informação de que uma revista chamada Escândalo extorquia dinheiro de
pessoas fotografadas em situações comprometedoras. Conta a história que o jornalista Alberto Dines, hoje editor do programa de tevê ´Observatório da Imprensa', preparava, para a manchete do dia seguinte, algo como "Imprensa amarela leva cineasta ao suicídio". O chefe de reportagem Calazans Fernandes achou o amarelo uma cor amena demais para o caráter trágico da notícia e sugeriu trocá-la por marrom.
Os teóricos, como Rosa Pedroso, enquadram a “imprensa marrom” como aquela em que há “valorização da emoção em detrimento da informação; exploração do extraordinário e do vulgar, de forma espetacular e
desproporcional”. Continua, conceituando como uma “produção discursiva sempre trágica, erótica, violenta, ridícula, insólita, grotesca ou fantástica”.
Mas isto, como diz Pierre Bourdieu, só existe graças ao pólo econômico, da já citada “penny press”, da imprensa como mercadoria ou produto.
A busca de prender a atenção do público a qualquer custo, sintomática em todas as plataformas disponíveis – jornal, revista, rádio, televisão e Internet - para difundir a informação, coloca em risco a credibilidade, a seriedade, a imparcialidade.
E, ao ultrapassar os limites, incorre nos crimes de invasão da privacidade, de difamação, calúnia e todas as outras hipóteses de atentados à intimidade de cidadãos. Este foi o abismo onde afundou o semanário News of the World, com seus quase 3 milhões de exemplares vendidos a cada domingo.
Muito exagero todos os dias lemos nas bancas de jornais e revistas, vemos nas telas digitais de nossos televisores e ouvimos nas diversas emissoras de rádio.
Que o fim do News, o pedido de desculpas de Murdoch e o abalo em seu império de comunicação sejam um semáforo de luz vermelha para a “imprensa marrom”!
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